Indústria automóvel está num impasse

| Revista ACP

Director-geral da Stellantis Portugal, Pedro Lazarino, critica a estratégia de eletrificação, a ausência de políticas para renovar o parque automóvel e a ausência de controlo da importação de usados.

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No mais recente episódio do podcast do Automóvel Club de Portugal, Pedro Lazarino, diretor-geral da Stellantis Portugal, deixou vários alertas sobre o rumo da indústria automóvel e a forma como a Europa está a conduzir a transição energética.

Logo no início da conversa, o responsável sublinha a importância de Portugal para o grupo: a Stellantis domina o mercado nacional, tem forte presença nas vendas de elétricos e mantém uma operação industrial estratégica em Mangualde.

Mas apesar da força do setor, Lazarino garante que o país vive hoje um problema estrutural sério: “No último ano agravámos a idade média do parque circulante para 14,1 anos.”

Segundo o gestor, o mercado automóvel aparenta recuperar, mas essa perceção é ilusória. “Quando comparamos com o período pré-pandemia, ainda estamos muito longe”, afirma.

Um dos maiores travões à renovação do parque é, nas suas palavras, “uma importação paralela absolutamente desmedida”, composta sobretudo por veículos antigos e poluentes que a Europa já não quer.

“Por cada dois carros novos que se vendem em Portugal, importa-se um usado da Europa”, avisa.

Outro fenómeno preocupante é o impacto do setor TVDE, que, segundo Lazarino, alimenta ainda mais a entrada de veículos antigos: “Hoje o TVDE é um dos maiores contribuintes para a importação de carros altamente poluentes para as nossas cidades.”

Quando o tema passa para a eletrificação total prevista para 2035, o responsável é categórico: “A meta de 2035 é completamente irrealista.”

Para os veículos comerciais, que “movem a economia”, Lazarino considera a transição impossível: “Não é uma questão tecnológica. É uma questão física. Não há pacote de baterias que permita substituir um furgão a diesel que faz Lisboa-Porto três vezes por semana.”

Nos automóveis de passageiros, reconhece que a eletrificação já representa 20% das vendas da Stellantis, mas sobretudo devido a benefícios fiscais nos carros de serviço.

Ainda assim, alerta: “Mesmo vendendo 25% de elétricos, estamos potencialmente a gerar multas todos os dias.”

Perante isto, defende frontalmente a revisão das metas europeias e uma transição mais pragmática: “É preciso formalizar o irrealismo destas datas.”

 

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Para Lazarino, a Europa isolou-se ao impor uma eletrificação acelerada enquanto o resto do mundo segue outros caminhos. “Não há nenhum ponto do mundo a discutir o fim dos combustíveis fósseis em 2035, exceto a Europa.”

Sobre alternativas, afirma que a Stellantis já está a testar combustíveis sintéticos e que estes podem permitir a continuidade de motores de combustão com impacto carbónico reduzido.

Mas volta a sublinhar que não existe debate público sobre o essencial: “O que me preocupa é continuarmos sentados em deadlines impossíveis, em vez de discutirmos como descarbonizar o parque circulante.”

O gestor recorda o sucesso do programa de abate de 2010 como exemplo de uma política eficaz que poderia ser relançada para acelerar a renovação do parque.

E reforça que seria uma medida com forte impacto ambiental e potencialmente neutra para o Estado.

Lazarino termina com uma crítica contundente à ausência de controlo na importação de usados: “Muitos carros entram em condições deploráveis, com pneus de neve em pleno verão e sem filtros de partículas. E entram com fuga fiscal, sem pagar ecotaxas.”

Para o responsável da Stellantis, este é o “verdadeiro adversário” do setor nacional e o grande obstáculo à descarbonização.


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