Desde o primeiro automóvel que o ronco do motor desperta emoções e uma adrenalina a que só o desporto motorizado consegue dar razão. Uma verdade que acabou por estar na origem do ACP, quando o grupo de fundadores do clube organizou a primeira corrida da Península Ibérica, em 1902. Um ano depois nascia o ACP. O bichinho das corridas tem sido alimentado de geração em geração, e quando o hobby é rotina e há talento torna-se profissão. Dos mais consagrados, como Armindo Araújo ou Bianchi Prata, aos mais promissores, como Manuel Espírito Santo, o apoio do ACP aos seus pilotos não falta.
Dos ralis e todo-terreno (TT) à velocidade, em quatro ou duas rodas, o clube apoia atualmente 22 versáteis pilotos. Qual é o propósito? Fomentar o desporto motorizado e elevar os pilotos que melhor representam a ambição pela vitória, a ética, a excelência e a responsabilidade ao volante. A promoção do desporto automóvel está na génese do clube.
Para assinalar o trabalho do Automóvel Club de Portugal no desporto motorizado, promovemos um encontro de todos os pilotos ACP. O pódio desta reunião foi a Sociedade de Geografia de Lisboa, edifício centenário onde o ACP foi fundado há 122 anos. Entre fotos e vídeos na Sala Portugal, na Sala da Índia e na Sala Algarve, todos foram partilhando histórias e experiências, num ambiente de fair-play.
Vozes da experiência
Aos 47 anos, Armindo Araújo é dos mais consagrados. Esteve em 176 ralis, foi sete vezes campeão nacional absoluto e duas vezes campeão do mundo de ralis de produção.
Curiosamente, prefere as duas rodas. “A minha grande paixão são as motos”, afirma. Teve a primeira aos seis anos e chegou a ser vice-campeão nacional de enduro, na classe 50 cc, mas foi nos automóveis, a partir de 2000, que conheceu o sabor das grandes vitórias. Mantém a ligação com o ACP há 20 anos.
José Pedro Fontes, 49 anos, também ele um dos mais experientes pilotos de ralis, sorri quando perguntam por episódios na cena automóvel. “As histórias que têm mais piada não posso contar”, brinca. Diz que nasceu numa “família de pilotos” e que teve “a sorte” de se tornar profissional.
Passou por quase todas as disciplinas do desporto automóvel, mas confessa “manter uma grande paixão pelos ralis”, onde se estreou há quase 30 anos. Objetivos? “Em cada etapa da carreira há desafios diferentes. Agora estamos a ser desafiados pelos mais jovens e isso dá-me gozo”, responde o campeão nacional de ralis em 2015 e 2016.
Há pontos em comum na história destes pilotos. A paixão tem raízes na família – responsabilidade de avós, pais ou tios – e o contacto com as máquinas e com as provas inicia-se muito cedo nas suas vidas. A predisposição dos mais próximos e o talento ditam o caminho. Miguel Barbosa é um exemplo disso.
“O desporto automóvel é a minha paixão”, diz o campeão nacional de todo-terreno (TT) por oito vezes. Aos 47 anos, lembra que começou, precisamente, no ACP ao tirar a sua primeira licença para competir nos karts, quando o clube tinha competências de federação.
Passou pela velocidade, onde foi campeão nacional duas vezes, e pelos ralis. Barbosa é também o responsável por Gonçalo Guerreiro ser piloto ACP. Aliás, é o mais recente piloto apoiado pelo clube.
Aos 24 anos, Guerreiro já se distingue dos demais em TT. As três vezes que venceu a Baja Portalegre 500, a conquista do título nacional de SSV em 2022, e o segundo lugar no Rally Dakar Challenger de 2025 captaram a atenção do clube e dão garantias para o futuro deste jovem que compete na categoria T4. O sonho é o Dakar, mas Guerreiro sabe que o “caminho ainda é longo”.
Luís Portela de Morais, com carreira em TT e no Rally-Raid partilha que esteve na primeira Baja Portalegre, em 1987, “quando estava na barriga da mãe" e, desde aí, está ligado ao desporto motorizado. Participou três vezes no Dakar e a ambição, além de ganhar, “é tentar ser um exemplo, ser melhor do que era no dia anterior”.
Novas Energias
Eduardo Carpinteiro Albino transporta-nos pela história do desporto motorizado.
O pai, o histórico Carpinteiro Albino, ganhou o primeiro rali de Portugal e Eduardo mantém o legado. “Sempre estive ligado aos automóveis de várias maneiras”, afirma. Procurou o sucesso nos ralis, mas não foi além da categoria de “iniciados”.
Seguiram-se anos como navegador de Miguel Barbosa numa equipa de TT, mas é nas novas formas de mobilidade que encontra o sucesso. Compete no Campeonato Nacional de Novas Energias, que promove fontes energéticas alternativas. Já venceu o campeonato por duas vezes.
“A prova é muito interessante para divulgar as novas formas de mobilidade”, diz.
“Num elétrico consigo ter uma velocidade de resposta que não consigo nos carros de combustão”, acrescenta.
O mesmo desafio é partilhado por Nuno Serrano, que foi o primeiro campeão de Novas Energias e também é piloto ACP. Ambos partilham ainda o gosto pelos ralis de regularidade com carros clássicos.
Mulher ao volante, vitória constante
Salvo algumas exceções, o desporto motorizado tem sido praticado sobretudo por homens. Mas o talento, o desportivismo e a paixão pela aventura e pela competição também são valências femininas.
O panorama está a mudar e Maria Luís Gameiro e Inês Ponte Grancha são exemplos.
“Devia haver mais mulheres. Estamos a colorir cada vez mais este desporto, mas ainda somos poucas. Há lugar para mais mulheres e muito boas pilotas”, defende a empresária Maria Luís Gameiro, que é piloto ACP em TT e compete há três anos.
A ligação às corridas surge através do marido, José Gameiro, que também é piloto.
“Só via de fora, mas tinha sempre o sangue a ferver para conseguir entrar. Felizmente tive essa oportunidade e fi-lo assim que pude”, relata a campeã em Portugal e Espanha (2023 e 2024).
O emblemático Rally Jameel, prova exclusivamente feminina na Arábia Saudita, faz parte da carreira e a piloto fez história no Dakar 2025 ao tornar-se a primeira mulher portuguesa a competir na prova 16 anos após a última participação feminina do país.
Inês Ponte Grancha está ligada ao desporto automóvel desde muito cedo. Entra em ralis desde os 16 anos, é navegadora do piloto José Pedro Fontes. Em 2016, sagrou-se campeã nacional de ralis, tendo sido a primeira mulher a fazê-lo. Esteve também no Rally Jameel de 2025 como copiloto de Maria Luís Gameiro, mas nem só de ralis se faz o percurso da navegadora.
“Também faço, esporadicamente, o campeonato TT em Portugal e já fui vice-campeã”, conta. É fisioterapeuta de profissão, mas “os automóveis são a grande paixão”.
A seguir as pisadas da Inês e da Maria Luís está Mariana Machado, mas na velocidade. A jovem piloto entrou no mundo das corridas por influência do pai. Começou nos karts aos cinco anos e, em 2015, foi campeã nacional. Aos 19 anos tem no palmarés a Ladies Cup de 2024 e uma presença no FIA Motorsport Games de 2022.
O foco está agora no campeonato Caterham Motorsport Iberia e o futuro passa por “melhorar a condução na velocidade”. “Gosto do patamar onde estou agora, mas gostava de um dia experimentar novamente os ralis”, diz.
Novos talentos em ascenção
As novas gerações ocupam um lugar especial. E o foco reside na velocidade, com os jovens pilotos a demonstrarem ambições internacionais. Quase todos apontam as 24 Horas de Le Mans como o grande objetivo de carreira.
Só um aponta à Fórmula 1 (F1) – Noah Monteiro, 15 anos, o piloto mais novo. É caso para escrever ‘filho de peixe sabe nadar’. O pai, Tiago Monteiro, foi o primeiro e até agora único português a atingir o pódio num Grande Prémio de F1. Noah está na Fórmula 4 (F4) mas não esconde o objetivo: “A minha grande ambição é chegar à F1”.
Conta com a ajuda do ACP e do pai que, segundo o jovem piloto, incute “vontade de trabalhar” e incentiva-o a “nunca desistir”. O jovem, embora demasiado novo mantém os pés no chão: “Se [a F1] não der, vamos optar por outro objetivo.”
Manuel Espírito Santo, 21 anos, corre no campeonato europeu de Le Mans Series, mas o que quer é chegar à “categoria mais alta e participar nas 24 Horas de Le Mans”.
“Não é um circuito qualquer, é muito rápido, sente-se a velocidade e a atmosfera de todo o fim de semana é surreal”, conta.
O luso-moçambicano Pedro Perino, 20 anos, começou a correr aos sete em Moçambique, mas lá era diferente. “Fazíamos a pista com pneus e fita-cola e corríamos no meio da cidade”, relata.Chegou a Portugal aos 11 anos, fez karts e chegou à Fórmula 4 italiana.
A carreira segue no campeonato europeu de Le Mans na categoria LMP2: “A ambição é conseguir ganhar as 24 horas de Le Mans na categoria principal e chegar aos hypercars.”
Duarte Pinto Coelho, 18 anos, não é diferente no sonho, mas mostra-se mais comedido nas palavras: “A ambição é ser piloto profissional, de GTs ou de protótipos. O gosto veio da família, a minha avó [Céu Pires de Lima] era piloto TT, o meu pai [Miguel Pinto Coelho] também foi e teve uma equipa. Passaram-me esse vício”, explica o jovem que foi campeão nacional de karts e compete na Iberian Supercars.
Guilherme Oliveira, que esteve na F4 Espanha pela mão do bicampeão mundial de F1 Fernando Alonso, demonstra-se modesto na ambição, mas convicto no propósito: “Quero continuar a fazer das corridas a minha vida, sou um amante do desporto motorizado.”
Por seu lado, Bernardo Pinheiro, jovem talento que cresceu no meio das corridas, não esconde o que quer. “O sonho é participar e ganhar as 24 Horas de Le Mans”, atira o piloto, filho do fundador do Autódromo Internacional do Algarve, Paulo Pinheiro.
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Em duas rodas
O desporto motorizado também se faz nas duas rodas. E o ACP está presente, sobretudo no apoio de pilotos históricos, como Pedro Bianchi Prata, 51 anos, e António Maio, 38 anos. O primeiro aprendeu a conduzir aos 8 anos numa Mobylette “no quintal dos avós” e, em 34 anos de carreira, foi oito vezes campeão nacional de Enduro e TT, cinco vezes campeão da Europa e campeão do mundo de bajas e 12 vezes finalista do Dakar. De todas as modalidades, a grande paixão é o Dakar e a ligação ao ACP vem desde 2007, com a criação do ACP Moto.
António Maio, que concilia a carreira de piloto com a vida de oficial da GNR, tem no palmarés, em 23 anos de carreira, oito campeonatos nacionais na geral e 22 títulos nacionais noutras classes, além de seis participações no Dakar. Considera a sua vida “um bolo espetacular”, entre a GNR, as corridas e os filhos.Bianchi Prata e Maio têm a concorrência dos mais novos, que pretendem igualar os feitos ou fazer melhor.
O respeito que Martim Ventura e os irmãos Salvador e Gonçalo Amaral têm pelos mais consagrados é notória. “Um piloto ambiciona sempre chegar o mais longe possível. O objetivo é o Dakar, é o futuro que ambiciono, é o topo da modalidade”, comenta Martim Ventura, que é também licenciado em engenharia eletrónica. Tem 24 anos mas vive as motos em TT desde os 10.
Entre os irmãos Amaral existe o mesmo desejo. “Daqui a 10 anos ambiciono ter já alguns Dakar em cima, é a nossa ambição máxima”, afirma, sem receios, Salvador – “há alguns riscos, mas é um bocadinho inevitável”. “Todos os pilotos TT ambicionam o Dakar”, reforça o irmão Gonçalo, para quem enrolar punho em “todas as corridas de TT” é “um treino para um dia conseguir chegar ao Dakar”.
Da bicicleta adaptada rumo ao sonho Dakar
A ligação do clube à sociedade também se faz através do desporto, e há uma história de superação que espelha esse compromisso.
Há 23 anos, Telmo Pinão perdeu a perna esquerda num acidente de moto4 e o desporto adaptado foi uma das formas que encontrou para manter uma vida ativa. Primeiro surgiu o paraciclismo, que o levou aos Jogos de Tóquio’2020 e Paris’2024. E desde 2022, o atleta paralímpico tem desafiado os limites do desporto motorizado.
Tem participado nas 24 Horas TT Vila de Fronteira, abrindo portas do automobilismo à mobilidade reduzida, sempre com o apoio do ACP. Na última edição proporcionou, juntamente com Miguel Pacheco, co-drives a pessoas com deficiência. O piloto ACP persegue um sonho: “Espero um dia participar no Dakar, é a minha prova de eleição.”